quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Um Personagem Imortal


Nesses tempos em que a informação tem a velocidade da internet e o noticiário prenuncia o fim do mundo (não necessariamente neste dezembro), não é fácil a vida de Papai Noel.  

 Avisto na praça de eventos de um shopping  a figura do cidadão que encarna o personagem com esmero.Não fosse o reparo de um colega jornalista que apontou o insólito de tê-lo visto,no ano passado, descer do trono, retirar o gorro e ir conversar com um segurança num prosaico fim de expediente, seria até capaz de imaginá-lo vindo do pólo norte para uma rápida escala ali na praça de eventos.

 Na visão dele, lembrei-me de outra “aparição” que presenciei há alguns anos, quando enxerguei Papai Noel na figura de um velhinho maltrapilho sentado ao lado de uma enorme trouxa num ponto da Avenida principal da cidade onde moro, São Carlos, no interior paulista. Tirando a magreza, tinha o layout de Santa Claus: longa barba branca, cabelos grisalhos e rosto avermelhado - um perfeito Papai Noel tupiniquim. No entanto, jazia na calçada, quase invisível aos olhos dos passantes, normalmente distraídos nessa época do ano. Faltava-lhe a indumentária do bom velhinho, coisa que me ocorreu de providenciar em um brechó. Horas depois, não estava mais no mesmo lugar, mas consegui encontrá-lo numa esquina perto da Praça do Mercado para entregar o presente. Eu nunca vi um velhinho tão feliz. “Passa por aqui hoje à noite que você vai me ver em cena”, me disse num largo sorriso.

 De fato, horas depois, lá estava no meio do povo – devidamente paramentado - e parecia divertir-se como um personagem dos contos de Dickens, distribuindo balas, que não sei onde arrumou, para as crianças. Nunca mais tive notícias daquele camarada, mas em particular naquele ano passei um Natal rock`n`roll ao resgatar a noção de que Papai Noel pode ser reinventado – como, aliás, tudo o que se relaciona com o estado de espírito e com o imaginário. 

 Quem não se lembra do tempo em que acreditava em Papai Noel e simplesmente porque a existência dele fazia todo sentido? O encanto não tinha a ver com ilusão porque criava um universo mágico e ao mesmo tempo real. Como os desenhos da TV, as estórias que a professora contava e os brinquedos e os jogos. 

 Um Jipe vermelho, de lata, com pedal, equipado com uma estridente buzina que era acionada no meio do volante, foi meu primeiro presente de Papai Noel. E também o segundo e o terceiro. Engenhoso, no final dos anos 60 meu pai antecipou em quarenta anos a moda da reciclagem de produtos e materiais, ao perceber que alguns meses depois de ganhar o Jipe, eu como típico geminiano o abandonava no fundo do quintal. Sequer percebia o sumiço do brinquedo quando, na proximidade do Natal seguinte, à pergunta se gostaria de ganhar um carrinho “igual àquele do ano passado”, ficava fascinado com a idéia. Bastava enviar uma cartinha para o Papai Noel e esperar. No amanhecer de 25 de dezembro, lá estava o novo Jipe de lata, com pedal, equipado com a estridente buzina acionada no meio do volante. E, claro, amarelo. Ou verde como o do ano seguinte. Papai Noel nunca negava fogo. E entrava sempre pela chaminé. Sim, na minha casa tinha chaminé.

 Eu não me recordo em que momento em que momento o velhinho desapareceu do meu imaginário. Mas sei de quanto reapareceu na época em que meus filhos tinham idade para viver esse pedaço feliz do Natal. Havia um consenso de que nem todo Papai Noel era o “de verdade”. Só os que tinham barba natural, como os que encontrávamos nos shoppings das cidades que visitávamos. Diante de um “ho, ho,ho” e o chacoalhar de um sininho, era comum ouvir a pergunta: “Esse é o de verdade?”

 Confesso que apesar da proximidade do Natal, eu não escreveria uma crônica sobre Papai Noel, porque sobre o tema o leitor há de ter muitas histórias que – estas sim – mereceriam registro. Mas escrevo para que você que agora lê este escrito, também revisite aquele canto da memória onde quem sabe um Papai Noel cochila.

 Num recente Natal, a imprensa noticiou que em Oldham, na Inglaterra, um professor foi demitido de uma escola primária depois de revelar aos alunos que Papai Noel não existe. A escola teve o requinte de enviar pedido de desculpas aos pais das crianças, que ficaram desconsoladas.

 O jornal da cidade tratou de divulgar o fato, com o depoimento de um pai de aluno indignado: “Meu filho chegou em casa e disse que o professor substituto contou para a turma que o Papai Noel não existe. Ele afirmou, ainda, que eram os pais que compravam os presentes. Meu filho quase chorou ao me contar o que aconteceu. Ele tem apenas 7 anos e estava encantando com a magia do Natal".

 Tudo tem seu tempo e o tempo de crer em Papai Noel pode durar pouco - mesmo que não se tenha um professor ao estilo Mister M – mas com certeza é o tempo mais marcante. E cá entre nós, até o fim do mundo, será sempre atual aquela frase de alguém que sentenciou: “A vida tem três etapas: na primeira a gente acredita em Papai Noel; na segunda não acredita; e na terceira é Papai Noel”. (Cirilo Braga)


Sobre o autor:

Jornalista da Câmara Municipal de São Carlos/SP

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